Mais transplantes em hospitais públicos de Mendoza: o impacto da crise e a falta de doadores
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Na última década (2015-2025), os hospitais privados realizaram o dobro de transplantes que o setor público, com 61,6% das intervenções, contra 38,4% dos hospitais estaduais. No entanto, essa tendência começou a se reverter nos últimos três anos.
O impacto da crise econômica no sistema de saúde também se refletiu nos transplantes. A recente desregulamentação das taxas de previdência social e seguro saúde pré-pago, juntamente com a queda do poder de compra, levaram um número maior de pessoas a recorrer ao sistema público em casos críticos.
Segundo dados do Sintra, sistema estatístico do Incucai, haverá um crescimento sustentado das operações de ablação e implantes nos hospitais estaduais a partir de 2022. “As pessoas são transplantadas onde o seguro de saúde tem acordo. Com o tempo, os acordos com o Estado aumentaram e isso aumentou a atividade", explica Cecilia Quiroga, coordenadora do Incaimen em Mendoza.
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Ele destaca ainda que o Hospital Central aumentou o número de cirurgias, em parte graças à criação de um centro de transplante de medula óssea, um programa de transplante de córnea, além do que já realiza (fígado, rim, etc.), o que impulsionou a atividade e resultou em um crescimento exponencial dos transplantes no setor estadual.
De fato, durante 2022, os hospitais estaduais da Grande Mendoza e das capitais do sul realizaram 232 transplantes no total; Ou seja, mais que o dobro dos 132 cadastrados em instituições privadas.
Há 318 pessoas esperando para serem transplantadasAtualmente, há 318 pessoas de Mendoza na lista de espera, aguardando para serem chamadas para se submeter a uma cirurgia de transplante, tanto de órgãos quanto de tecidos. Embora o número seja dinâmico, Incucai afirma que é preciso manter a lacuna “o menor possível” entre doadores e pacientes que buscam transplantes.
Neste sentido, a tarefa de captação de órgãos nos serviços de terapia intensiva dos hospitais é essencial, o que exige capacitação, maior vontade e melhores salários, pois, em pouco tempo, a captação de órgãos põe em jogo diversas habilidades: ativar a análise clínica completa (tomografia e estudos diversos) do paciente em estado crítico; detectar quando há morte cerebral; comunicar-se com terapeutas e informar a família sobre o destino dos órgãos do seu ente querido. Claro, a menos que o paciente tenha expressado previamente por escrito sua oposição à doação de seus órgãos.
“Há uma necessidade crescente de transplantes e o número de doadores permanece estável, criando uma lacuna que precisamos reduzir. Sabemos que chegar à lista zero é uma utopia, mas é possível dar uma resposta melhor a quem espera por um órgão", explica Quiroga ao Los Andes.
90% dos doadores vêm do setor públicoOutro dado marcante do Incucai é que quase todos os doadores de órgãos e tecidos em Mendoza vêm de hospitais públicos (87,7%), em comparação com 12,3% que vêm do setor privado. Para alguns cirurgiões consultados, porém, essa diferença é "histórica", já que hospitais públicos, como o Hospital Central, recebem a maioria dos pacientes com traumas graves, o que aumenta a possibilidade de morte encefálica e posterior doação. No entanto, nos últimos anos, a diferença aumentou devido a vários fatores.
Para Quiroga, também especialista em Terapia Intensiva, o baixo número de doadores em clínicas privadas se deve a falhas nos mecanismos de captação. A ativação dos protocolos de ablação e implantação depende em grande parte da velocidade com que as equipes médicas detectam potenciais doadores em terapia intensiva.
“As unidades de terapia intensiva dos hospitais privados não têm uma alta atividade de captação, embora várias instituições tenham seus próprios centros de transplante. É essencial que aumentem as aquisições para atender à crescente demanda, caso contrário, o número de órgãos e tecidos disponíveis continuará sendo insuficiente", conclui Quiroga.
A Lei Justina, uma mudança de paradigma nacionalEm 2018, com a aprovação unânime do Congresso, a Argentina aprovou a Lei Justina (27.447), um marco na doação de órgãos. Inspirada na história de Justina Lo Cane, uma menina de 12 anos que morreu esperando por um transplante de coração, a lei estabelece que todas as pessoas são doadoras por padrão, a menos que declarem o contrário por escrito.
A lei mudou o paradigma da doação de órgãos no país, eliminando a necessidade de consentimento familiar, fator que muitas vezes atrasava ou impedia o procedimento devido ao impacto emocional do luto. Atualmente, a única maneira de não ser doador é declarando formalmente no Documento Nacional de Identidade (DNI) ou por meio do Instituto Nacional Central de Coordenação de Ablação e Implantação ( Incucai ). O registro na carteira de motorista não é válido.
A especialista em obtenção de órgãos Cecilia Quiroga relembra situações complexas em que as famílias reagiram com resistência. “Encontramos parentes que ameaçam, sacam armas ou criam situações tensas. Às vezes, é preciso esperar até 14 horas para que outro parente mais conciliador dê seu consentimento", diz ela. Embora a lei estabeleça a doação como norma, ainda há relutância na área pediátrica, pois são os adultos que decidem sobre os menores.
Incucai recomenda que cada pessoa expresse seus desejos em vida para agilizar as operações de ablação em caso de morte. Para isso, você pode registrar sua decisão no aplicativo Mi Argentina, no registro civil ou no momento da renovação do seu documento de identidade. Essa ação simples pode significar a diferença entre a vida e a morte para aqueles que esperam por um transplante.
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