<![CDATA[ Razões práticas e diplomáticas ]]>
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Para se defender das críticas à autorização de entrada limitada de ajuda humanitária em Gaza, Benjamin Netanyahu invocou esta semana «razões práticas e diplomáticas.»
Fome generalizada prejudicaria as operações militares para controlo total do enclave, dificultando, ademais, o apoio de «estados amigos», afirmou o chefe do governo de Telavive. Partidos de extrema-direita, designadamente «Sionismo Religioso», liderado por Bezalel Smotrich, e «Poder Judaico», de Itamar Ben-Gvir, contestaram de imediato a decisão do primeiro-ministro, insistindo na imposição de um bloqueio total. A sorte da população de Gaza, de resto, está longe de comover a opinião pública judaica, ainda que a ONU considere insuficiente o auxílio que tem vindo a ser fornecido e advirta para uma catástrofe sanitária. Independentemente do que possa vir a acontecer a cerca de duas dezenas de reféns presumivelmente ainda vivos, a maior parte dos judeus israelitas aprova a prossecução da ofensiva em Gaza, que tem um contraponto nas operações militares e expansão dos colonatos na Cisjordânia. Uma sondagem divulgada sexta-feira pelo diário Maariv indica o apoio de 51% dos inquiridos à ofensiva em Gaza, enquanto 39% se manifestam contra e 10% se dizem indecisos. O inquérito, realizado quarta-feira e quinta-feira, após o recomeço da entrada limitada de auxílio de emergência, constata, ainda, que 43% dos judeus israelitas julgam apropriada a intensidade bélica da ofensiva e 27% advogam que as operações militares se intensifiquem. Apenas 15% consideram excessivo o nível de emprego de força letal. O assassínio de dois funcionários da embaixada de Israel em Washington, na quarta-feira, por um norte-americano aos gritos de «Palestina Livre», exaltou ainda mais os ânimos. Netanyahu redobrou a denúncia de estados estrangeiros como fautores de antissemitismo, designadamente a Grã-Bretanha e a França. Os críticos do governo de Telavive promovem o ódio aos judeus, uma praga que alastra, levando a um aumento de ataques a judeus no estrangeiro, é a tese das autoridades do «estado do povo judeu», conforme Israel se define desde 2018, descartando plenos direitos a árabes, drusos e demais cidadãos. O incremento desde 2023 de ataques físicos e ameaças a pessoas e entidades judaicas é, com efeito, alarmante, conforme indicam as estatísticas compiladas pelo Programa de Estudos Religiosos da Universidade de Telavive relativas à França, Argentina, Alemanha, Austrália ou Grã-Bretanha, entre outros países. A causa próxima é a violência da retaliação israelita ao ataque terrorista desencadeado pelo Hamas a 7 de Outubro que provocou cerca de 1 200 mortos em Israel. O lodo das profundezas de contenciosos históricos reais ou imaginários em que avultam fenómenos de hostilidade religiosa e suas manipulações emerge, por sua vez, arrastado pela virulência de novos conflitos. Em Gaza terão morrido em consequência dos ataques israelitas mais de 50 mil palestinianos, entre civis não envolvidos em combates e militantes do Hamas e Jihad Islâmica, ascendendo ao dobro o número de feridos. Ao restringir o acesso de órgãos de informação estrangeiros e de observadores de entidades internacionais a Gaza, Israel visa, sobretudo, pôr em causa a credibilidade dos relatos e testemunhos materiais de crimes de guerra e a realidade da destruição sistemática do enclave para inviabilizar a subsistência e permanência de dois milhões de palestinianos. O Hamas continua activo em Gaza, tal como na Cisjordânia, utilizando instalações civis, designadamente hospitais, para acoitar combatentes e material militar, tentando controlar a distribuição de ajuda humanitária e reprimindo qualquer contestação. Israel ataca sem qualquer consideração por vítimas colaterais, ou seja, civis não envolvidos em combates, e arroga-se o direito de expulsar os residentes de Gaza. Uma limpeza étnica, à semelhança de tantas outras ocorridas desde 1947, ou seja, a expulsão coerciva ou massacre de populações, está em curso e é assumida num discurso abertamente genocidário por parte de responsáveis políticos e militares israelitas. Do lado palestiniano, o jihadismo militarmente impotente e ideologicamente virulento e influente, não descarta, igualmente, o seu objectivo de obliteração da «entidade sionista». O movimento sionista de implantação colonial na Palestina Otomana, iniciado no século XX e prosseguido sob o Mandato Britânico, impôs-se à custa de árabes, berberes e druzos. Judeus sobreviventes dos massacres nazis na Europa e oriundos de países árabes, além da Etiópia, foram, posteriormente, integrados no estado sionista, mas a questão da coexistência política entre Israel e estados árabes e do estatuto das comunidades sacrificadas à expansão judaica ficou em aberto. A aceitação mútua e efectiva do princípio de reconhecimento do direito à coexistência de dois estados por parte de israelitas e palestinianos é actualmente uma quimera. O Estado da Palestina, proclamado oficialmente em Novembro de 1988, é uma entidade inviável, desmembrada, na sua presente configuração geográfica, ainda que reconhecida por 147 dos 193 membros da ONU. Nem a presidência corrupta e falaciosa de Mahmoud Abbas na Cisjordânia ou a desdita terrorista do Hamas em Gaza se recomendam.
Reconhecer o Estado da Palestina é relevante para fazer valer o princípio da negociação política e essa é a única consideração que importa e que Portugal deve ter em conta.
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sabado