É possível evitar o consumo de microplásticos? Um cientista colombiano que liderou um estudo sobre a presença desses contaminantes na placenta responde.

A presença de microplásticos no corpo humano ocorre antes mesmo do nascimento. Isso é confirmado por um estudo pioneiro na América Latina, liderado pela Universidade Nacional da Colômbia (campus de Manizales), a Universidade de Caldas e o Hospital Universitário SES de Caldas, que detectou esses contaminantes em placentas humanas. O estudo, que analisou amostras de 12 mulheres com diferentes padrões de parto e protocolos médicos, encontrou microplásticos tanto no lado fetal quanto no materno, bem como no cordão umbilical, demonstrando que a exposição pode começar antes mesmo do nascimento.
A pesquisa, apresentada no Congresso da Sociedade Internacional de Epidemiologia Ambiental, lança nova luz sobre os efeitos que essas partículas podem ter na saúde materna e fetal. A diretora do estudo, Elisabeth Restrepo Parra, física com doutorado em Ciência e Tecnologia de Materiais e professora titular da Universidade Nacional, também fez parte do grupo de pesquisadores que participou dos relatórios para a Plataforma de Ação sobre Plásticos, uma parceria entre o Ministério do Meio Ambiente, o Fórum Econômico Mundial e o governo do Reino Unido.

Elisabeth Restrepo Parra, física, doutora em Ciência e Tecnologia de Materiais. Foto: Santiago Felipe Ignacio Lopez A.
Restrepo alerta que os efeitos dos microplásticos na saúde humana ainda são pouco compreendidos. "Estamos na fase de diagnóstico", afirma. A cientista enfatiza que os recursos de pesquisa em países em desenvolvimento são limitados, o que tem dificultado o progresso nessa área.
Em entrevista ao EL TIEMPO, o cientista analisa se é possível evitar o consumo de microplásticos, explica o quão expostos estamos e por que é necessária uma resposta global para lidar com um contaminante que já circula pelo ar, pela água, pelos alimentos... e agora, também, pela placenta.

Uma pessoa comum pode ingerir até 5 gramas de microplásticos por semana. Foto: iStock
Porque até agora pensávamos que adquiriamos esses microplásticos através da vida cotidiana e do contato. Mas o fato de eles estarem na placenta e nos fetos significa que já os carregamos. E esses plásticos, em última análise, são contaminantes que entram no corpo e podem causar problemas de saúde.
É possível evitar o consumo de microplásticos? Não. Para evitar que os microplásticos cheguem aos organismos, teríamos que desenvolver uma estratégia que, na minha opinião, seja agressiva, envolvendo diversas entidades, principalmente governamentais, com regulamentações que melhorem a qualidade do ar, por exemplo, e que promovam o desenvolvimento de produtos plásticos menos poluentes.
Isso significa que não depende do comportamento individual? Isso mesmo. É uma questão muito difícil, porque os plásticos estão em nossas vidas; estamos cercados por eles e precisamos deles. Teria que andar de mãos dadas com regulamentações, mas acima de tudo com muita pesquisa que nos permita identificar estratégias técnicas para reduzir esses poluentes. Não é algo que uma pessoa possa controlar sozinha. Talvez alguém decida não comer alimentos embalados, mas não saiba como foi o processo antes de colocar as mãos neles. Ou a água que bebe, ou o ar que respira: não podemos evitar.

Vários estudos identificaram microplásticos nos oceanos Atlântico e Pacífico. Foto: Diretoria de Comunicações da UIS
Os estudos estão apenas começando. Além disso, exigem um apoio financeiro significativo. Na Colômbia, houve algum progresso recentemente graças a recursos do Ministério da Ciência e do Sistema Geral de Royalties. Mas um grande obstáculo para pesquisas futuras em um país em desenvolvimento são os recursos limitados disponíveis. Globalmente, também não houve muito progresso. Este é um tópico novo. Microplásticos têm sido estudados em peixes e outros ambientes, mas não tanto em humanos. É por isso que somos pioneiros na Colômbia e na América Latina.
E quanto se sabe sobre como elas afetam a saúde humana? Esse estudo ainda não foi feito porque é um tópico muito novo. Estamos apenas na fase de diagnóstico: saber que eles existem e que estão presentes desde o nascimento. Para entender como eles afetam os seres vivos, precisamos conduzir estudos de longo prazo, medir quantidades de plástico e monitorar pessoas. Alguns estudos preliminares sugerem que eles podem causar obstrução celular, ou seja, bloquear os tubos pelos quais as células se alimentam ou respiram. Isso é prejudicial às células e, portanto, a nós.
Qual é o próximo passo na sua pesquisa? Estamos estudando se os microplásticos estão associados a patologias durante a gravidez, como pré-eclâmpsia ou parto prematuro. Já identificamos que eles estão presentes na placenta, provavelmente no feto, e também há estudos que os encontraram no leite materno. Em outras palavras, continuamos a consumi-los. Agora, queremos ver se há correlação com certas doenças.
O que as autoridades devem fazer em resposta a essas descobertas? Isso requer a união de muitos atores. Um único governo não pode mitigar esse efeito, porque todos nós consumimos ar. Precisamos trabalhar juntos em nível global. E é fundamental trabalhar com cientistas, porque esses estudos exigem conhecimento técnico especializado. Com base nessa pesquisa, é preciso criar políticas públicas — mas uma política global, porque os plásticos estão por toda parte, e seus resíduos contaminam rios, solo, peixes, plantas e assim por diante, e isso se bioacumula.

O estudo identificou microplásticos na placenta humana. Foto: iStock
Insisto na importância de buscar recursos e financiamento para desenvolver esses projetos. Eles são essenciais para a saúde humana e a saúde do planeta. Devemos continuar investindo em pesquisas em saúde e meio ambiente, porque elas levam a descobertas importantes como esta. E, acima de tudo, devemos nos unir para trabalhar juntos.
Jornalista de Meio Ambiente e Saúde
eltiempo